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Cerco aos políticos brasileiros aperta

As próximas eleições haverá um fator novo: a opinião pública fiscaliza cada vez mais as ações políticas

Juan Arias
Congreso de Brasil
Congreso de BrasilAFP

Os políticos brasileiros, depois das manifestações de junho passado, já não tem a mesma vida fácil. Agora, são vigiados atentamente pela opinião pública, que fiscaliza cada vez mais os seus atos. Isto cria uma reação em cadeia. Encurralados pelos eleitores, os políticos fazem esforços em todos os níveis para aparentar que ouvem o “eco das ruas”.

Por isso, espalham promessas; convertem-se em juízes de si mesmos e pretendem parecer sinceros e democráticos. No Congresso, mais de mil funcionários acabam de ser obrigados a devolver parte dos salários que haviam recebido e que não lhes correspondiam, pois superava o teto do salário máximo previsto.

Até ontem, faziam vistas grossas. Agora, até o presidente do Senado, Renan Calheiros, controla com mão firme os gastos da instituição quase como um Savanarola, embora ele próprio esteja sendo processado pelo Supremo Tribunal Federal por suposta corrupção e existam mais de um milhão de assinaturas no Senado pedindo a sua saída do cargo.

Nas assembleias regionais e municipais, deputados e vereadores tampouco têm uma vida fácil. Muitas destas Câmaras acabam sendo ocupadas à força pelos cidadãos comuns que querem participar e opinar quando suas senhorias discutem projetos de lei que os afetam pessoalmente.

Em alguns casos, como o dos professores do Rio, em greve há quase dois meses, os que tinham ocupado a Câmara municipal foram expulsos com gás lacrimogêneo, o que agravou os protestos ainda mais.

O senador Cristóvão Buarque, ex-ministro de Educação do ex-presidente Lula da Silva e ex-reitor da Universidade de Brasília, um intelectual sério que nunca foi involucrado em qualquer tipo de escândalo de corrupção, apresentou um projeto de lei que limita ainda mais os desmandos dos políticos em todos os níveis: senadores, deputados, governadores, prefeitos e vereadores.

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Segundo a sua proposta, que dificilmente será rejeitada, todo político, antes de se candidatar, deverá apresentar um programa detalhado do que pensa fazer se for eleito. Inclusive com datas de realização.

Deverá indicar até as suas intenções de permanecer no partido pelo que se eleger sem emigrar na primeira oportunidade para outro que lhe ofereça melhores benefícios. De fato, há políticos que já migraram de partido cinco vezes. Em alguns casos, porque um oferecia, por exemplo, um gabinete maior no Congresso.

Hoje, os políticos que mudam de partido deveriam perder o assento. Isto foi legislado para evitar os êxodos. Porém, sobraram frestas por onde escapar da lei: basta, por exemplo, demonstrar que não pode exercer a sua ideologia no partido pelo que foi eleito ou, no caso de criação de um novo partido, é permitido afilar-se a ele sem consequências. Alguns partidos são criados apenas para receber os desertores que correm atrás de vantagens.

Esta vigilância ou acosso aos políticos, que até ontem viviam na maior tranquilidade, fazendo e desfazendo a seu bel-prazer por estarem convencidos de que após alguns meses os eleitores não se lembrariam em quem tinham votado nas eleições é algo novo no país. E é fruto dos protestos e do despertar de uma maior consciência política nos cidadãos.

Eles não pedem a lua. Não estão provocando uma revolução. Simplesmente exigem aos seus representantes que cumpram com o seu dever e lhes recordam que não foram eleitos para legislar em favor próprio ou dos seus interesses patrimoniais e pessoais, mas da sociedade.

Os fazem recordar que exercer a política os compromete com o bem comum e devem ser os primeiros a ser transparentes e estar ao serviço da comunidade. Ontem, às vésperas do Dia do Professor, numa charge um menino diz ao pai que quando crescer quer ser professor. “Melhor ser político, filho, e se for corrupto melhor ainda, porque você vai tirar a família toda da miséria”, responde o pai.

É algo parecido ao que o romancista João Ubaldo, sempre caustico, escreveu na sua suculenta coluna no jornal O Globo, explicando por que no Brasil não havia “indignados”. Isto foi antes dos protestos nas ruas. Ele escreveu que isso era impossível porque o sonho das famílias era poder ter “um político corrupto” para “resolver todos os seus problemas”.

Tudo isto começa a desaparecer depois que os brasileiros se tornaram mais exigentes com os que decidem o seu futuro. Agora, os políticos serão examinados antes e depois de serem ungidos com o voto. Voto pelo qual muitos deles venderiam a alma ao diabo. Como afirmou a própria presidente, Dilma Rousseff.

Tradução de Cristina Cavalcanti

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